GESTÃO PARTICIPATIVA E PROJETO POLÍTICO PEDAGÓGICO NUMA ESCOLA COMUNITÁRIA: DESAFIOS E POSSIBILIDADES

Mirian Garfinkel(UNESA)

Introdução

A realidade educacional brasileira apresenta uma sucessão de paradoxos. De norte a sul, fala-se de educação, da necessidade de formação de um cidadão

consciente e que consiga responder aos desafios de qualquer ordem – não me fixo especificamente nos desafios tecnológicos - para conseguir qualidade de vida.

Algumas questões vão pautar o desenvolvimento desta pesquisa. Já não basta perguntar qual o papel da escola. Ë necessário agregar a este questionamento o como se relaciona com o entorno em que está inserida, se atende as expectativas desta comunidade, respeitada a comunidade qualquer que seja sua localização, sua ocupação e seu padrão de vida eu vai apontar o tipo de cultura local. Assim sendo, a equipe pedagógica que em última análise espera-se conheça a nova lei de educação e esteja empenhada em uma práxis

que permita aquela comunidade inicialmente se converter em comunidade, necessita também estar preparada para reconhecer nesta comunidade seus parceiros de desenvolvimento para que todos os envolvidos no ensinar- aprender consigam fazer a alfabetização e leitura de mundo que favoreça aos jovens a sua inclusão cidadã na sociedade maior.

Segundo Hargreaves( apud Hernández, 1996, p.102) " a cultura da incerteza caracteriza um mundo onde a profusão de imagens e fragmentos de sons fugazes pareçam efêmero e superficial(...) , as identidades já nem tem raízes, e alguma relações nem estão ancoradas em compromissos morais... Isto levanta outra questão de como a escola vai administrar o binômio ser/ saber, já que os valores se volatizam ao contato com a massa de propaganda , de informação não digerida e de um processo de alienação que afasta este homem em qualquer nível que esteja de praticar o santo dever de pensar.

Assim este estudo tem por objetivo acompanhar a implantação de um projeto político pedagógico fundamentado em uma filosofia que distingue: o aprendente como centro do processo; entende o aluno em seu contexto global, para assim poder aproveitar sua potencialidade não só cognitiva como também sociais e pessoais; adapta o ritmo do aprender do aluno, seus objetivos e conteúdos a capacidade do aluno seu estilo, orientando o em suas necessidades; oferece ao aluno uma imensa variedade de opções quanto ao tempo, espaço, conteúdos de tal maneira que possa ter a possibilidade de realizar seu aprendizado quer individualmente, quer no e com o grupo; favorece ao aluno a participação na construção de seu conhecimento; desenvolve critério s e instrumentos de avaliação que acompanham a aluno olhando o dentro de processo – o mais importante é o processo , o produto é uma consequência.

É uma rede de relações e ações otimizando ensinar e aprender de for a flexível ao mesmo tempo que desenvolve espaços de estudo que vão estimular a curiosidade do aluno, desafiando o constantemente de tal maneira que se aproprie da tarefa.

Isto porem vai exigir do ensinante e de toda equipe da escola – aqui não pode ser apenas alguns envolvidos - uma imersão nos diferentes campos de estudo, dos processos de aprendizagem conhecimentos de meios e estratégias e tecnologias mais avançados para uma apropriação do saber .

Com o envolvimento de todos como foi observado na pesquisa começam a acontecer mudanças tanto no aspecto pedagógico como administrativo, tanto no tecnológico como no social. O processo extrapola as paredes da escola. Na medida em que a participação é mais intensa atingimos um estágio em que aprender a aprender e para todos constituindo se assim a comunidade educativa que integradamente , às vezes mais rapidamente, por outras vezes tendo que retroceder por algum motivo relevante, vai contribuir sobremaneira para o desenvolvimento de sua comunidade em todos os sentidos.

Metodologia

A pesquisa foi do tipo estudo de caso, com características de pesquisa qualitativa (Triviños, 1995), realizada em uma escola, a partir de um pesquisador, instrumento-chave. Ë descritiva; o pesquisador está mais preocupado com o processo do que necessariamente com os resultados; existe a tendência de analisar os dados indutivamente; entende o significado, o código dos dados, para clarificar situações e chegar a dados elucidativos em relação à questão proposta.

A pesquisa pretendeu levantar o nível de atendimento do programa às necessidades desta comunidade, buscando descrever a partir do material coletado os resultados obtidos. Objetivou descobrir variáveis capazes de oferecer pistas para o desenvolvimento de uma instituição, "que integra, não porque os indivíduos passam muito tempo nela, mas porque cria consciências integradoras, cria a a idéia que a possibilidade de realização individual está vinculada à idéia de uma realização coletiva" ( Gentili, 1998, p.105). Foram entrevistadas dezoito pessoas que desempenham diferentes funções na instituição, propiciando ao estudo uma gama de olhares que leva a encontrar pontos de interseção na rede de significados em que se transforma o conjunto de entrevistas. Entrevistas estas do tipo semi estruturado, já que "partem de certos questionamentos básicos, apoiados em teorias e hipóteses que interessam a pesquisa, oferecendo posteriormente um amplo campo para questionamentos, enriquecidos pelos dados dos informantes."( Triviños, 1995, p.146). Por outro lado este procedimento abre espaço de interação para o pesquisador, que assim é um parceiro na elaboração do conteúdo da pesquisa.

Após a realização da pesquisa foi realizada a transcrição das falas, adotando-se a técnica de análise de conteúdo, através do levantamento de temas emergentes das falas que podem fazer surgir a rede de relações, que podem surgir segundo Minayo(1993, p.208) "através de uma palavra, de uma frase, de um resumo". Os dados foram categorizados de

acordo com análise temática( Bardin, 1988. p.108) de tal forma que possam responder às questões formuladas.

Resultados

Emergiram nas falas contextos que envolviam autonomia; ação do coletivo; relação vincular da escola/comunidade e estratégias inovadoras em sala de aula. Cada item deste tinha como pano de fundo termos como ensinante, aprendente, ser, saber, ouvir, ser ouvido, integração, parceria, agir comunicativo, enfim um contexto que ressignificava o dia a dia da escola, que está inserida no cenário comunitário.

No que tange a autonomia, o referencial foi Paulo Freire, e que assim se reporta a este valor básico no constructo de cada ser humano: "o respeito à autonomia e à dignidade de cada um é um imperativo ético e não um favor que podemos conceder uns aos outros(...)

saber que devo respeito à autonomia e a identidade do educando exige de mim uma prática em tudo coerente com este saber (Freire,1999, p.66/67). As falas denotam a consciência, que os professores tem, de que suas práticas vão definir esta realidade.

Pontuam que é necessário saberem mais, o que significa que precisam estudar mais para poderem evoluir sempre. Na realidade eles apontam para um estado de aprender a aprender quer da teoria, quer do empírico. com muita clareza. É um passo qualitativo em relação ao seu papel , que sai do centro da sala para ocupar outros espaços, socializando assim o conhecimento que vem de cada um, de cada lugar , de cada grupamento, de grande importância na mistura da argamassa que leva a construção de novos conhecimentos.

Há uma ênfase na conclusão de que urge agir, fazer, refletir, avaliar e continuar fazendo. O agir comunicativo assim como o define Habermas (1990), que depende do uso da linguagem dirigida ao entendimento, o que pressupõe uma escuta de qualidade, códigos comuns de linguagem, respeito ao tempo de fala e elaboração de cada um, entendimento do Outro em uma prática dialógica, e os (...) participantes do processo definir cooperativamente seus planos de ação, levando em conta uns aos outros, no horizonte de um mundo da vida compartilhado e na base de interpretações comuns de situação (Habermas, idem, p.72). Há falas que desnudam a questão do professor, quanto à apropriação do mesmo em relação ao seu plano de trabalho. Os professores solicitam mais

tempo para praticar a meta cognição que estão a praticar com seus alunos. E neste ponto retoma-se Habermas que aponta para a "prática da argumentação, porque esta permite continuar a ação comunicativa, quando há desacordo.( Aragão ,1992, p.36).

Nem sempre práticas comunicativas rotineiras permitem chegar a consenso.Este trabalho desvela apenas uma parte da rede de relações da escola com a comunidade que tende a formular um conceito de comunidade educativa, em que todos, definidos seus papéis, participam da construção de um espaço comunitário, que visa atender a objetivos comuns e que respeitando a individualidade de cada um compõe um cenário pluralista e multicultural de viver e conviver criativamente.

Referências Bibliográficas

ARAGÃO, Lúcia. Maria. Razão Comunicativa e teoria social crítica de Habermas. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1992

BARDIN, Laurence. Análise de conteúdo. Lisboa: Editora 70, 1988.

FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia; saberes necessários e prática educativa. São Paulo: Paz e Terra, 1996.

GENTILLI, Pablo et al. Neoliberalismo, Alternativas. Rio de Janeiro: Novamerica, 1998.

HABERMAS, Jurgen. Pensamento Pós-metafísico: estudos filosóficos. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1990.

HERNÁNDEZ, Fernando. Cultura visual, mudanças educativas e projetos de trabalho. Porto Alegre: Artes Médicas, 2000.

MINAYO, Maria Cecília. O desafio do conhecimento: pesquisa qualitativa em saúde. Rio de Janeiro/São Paulo: Hucitec-Abrasco, 1993.

TRIVIÑOS, Augusto. Introdução à Pesquisa em Ciências Sociais. SÃO Paulo: Atlas, 1995 .